Fortaleza
Que beleza!
Os verdes mares bravios de águas quentes
A natureza do coqueiral alçando voo ao infinito
A jangada de piúba com o seu Dragão do Mar
A brisa sempre a passar levando o cheiro do sal
O sol fresco se espraiando pelos quintais de pomares
A Sabiá, o rouxinol, o Bem-te-vi
O Galo de Campina, o Canário da Terra
O tempo se foi
A memória se foi
A história se foi
A Cidade se foi
Nas esquinas sem memória
Nos espaços sem história
Sem lembranças
Sem o Pirambu do Chico da Silva
Que hoje é da maconha
Sem o Morro do Ouro do Eduardo Campos
Que hoje é da maconha
Sem a cearense brejeira e faceira
Com a bacia de roupa na beira da lagoa
Lavando a roupa da sinhá
Que hoje e da maconha e da prostituição na Beira Mar
Tudo se foi
Sem volta
Sem pensar...
Cheguei antem e te encontrei a mesma que deixei
A mesmice provinciana que carregas nos conceitos
E também nos preconceitos
Nos tentáculos dos atos
Nas rodas ebrias das trocas
Na ressaca da capacidade de seduzir
Sem parir o pão dos inocentes
A mesma alegria bêbada que contagia
O mesmo sol quente que mata gente
A mesma nostalgia do entardecer sem esperança
A mesma beira mar congestionada sem lembranças
Caminhando sem cessar
O mesmo calor sem cor
Malandro
Melando meu corpo de maresia
Amolecendo o meu coração
Anestesiando minha cabeça
Vomitando tragedia
Comédia
Parei!...
Quanta dor ter que te dizer
Todo este clamor
Queria mesmo era que
Todo o prazer de te rever
Se transformasse em paz
Mas…
Impossível!
Preciso te caminhar
Te confidenciar o passado
Memórias
Sorrindo...
Sem olhar para todos os lados
Sem querer ser alado
Sem pedir passagem a criminalidade
Sem bala zumbindo ao meu lado
Sem ver tudo passar
E não encontrar uma razão
Uma oração
Por que?
Não existe mais a minha infância inocente
Não existe mais o meu recanto adolescente
Na ingenuidade dos teus braços cajueiros
Nos quintais, nas cacimbas, nos coqueirais
Legado que ficou lá atrás
Nem as pipas entrelaçadas no céu
Com crianças sem véu
Gritando a brincar
Agora
Pitando drogas
Portando armas
Matando, cortando na veia
Alheias, abortando, morrendo
Coqueiros sem arranha-céus
Tempos roubados
Pelo espaço aço
Pelo espaço concreto
Sem afeto
Cortando o coração da minha Cidade
Sem mais nem menos
Sem acenos
Sem a canção do apito do trem
De quem volta
De quem vem
Sem o sino da igreja
Sem aviso da oração
Não convém ao progresso
Não convém o regresso
Quem não te vê
Quem não te crer
Quem não quer ser você de hoje
Que te compre o amanhã
Rompe o que corrompe toda a ingenuidade
Desta Cidade onde nasci
E hoje esqueci
Sou obrigado a esquecer
Sou obrigado a fugir
Por que?
Sem carinho e sem afeto
Feto de quem foi
Abortado
Sem nada a compor
Sem repor
Nem decompor
Estou somente no teu passado
O presente são outros campos arados…
Fortaleza!
Quanta beleza ficou pra trás…
Alvaro de Oliveira Neto
Fortaleza 10 de outubro de 2014